Nos últimos tempos, sobretudo em função da difusão dos novos meios de comunicação, passamos a assistir (ativamente ou passivamente) a constantes ataques que enaltecem a figura da intolerância, ao mesmo tempo em que desnutrem o papel importantíssimo da comunicação no desenvolvimento dos indivíduos enquanto seres humanos. Desse modo, a comunicação em rede também tem trazido à tona o lado obscuro do homem, além de, obviamente, evidenciar quão distantes estamos de estabelecer entre nós um elo comunicativo.

Para Ezio Mauro, jornalista italiano, isso ocorre pelo fato de que a comunicação em rede ainda não conseguiu se estabelecer como uma estrutura baseada em troca de cultura. Pelo contrário, ela possibilitou um aumento exponencial na quantidade de relações, mas estas têm como fundamento primordial a igualdade, a qual, entretanto, é diferente da igualdade a qual nos referimos quando pensamos no decorrer dos dois últimos séculos. Essa ideia é defendida por Mauro em “Babel – Entre a Incerteza e a Esperança”, escrito em forma de diálogo com Zygmunt Bauman:

“NÓS TENDEMOS A VIVER E A NAVEGAR ENTRE NOSSOS IGUAIS, MAS O CONCEITO DE IGUALDADE DOS SÉCULOS XIX E XX MUDOU DE SIGNIFICADO. IGUALDADE AGORA SIGNIFICA APENAS CONCORDÂNCIA, UM MUNDO QUE CONCORDE À MINHA VOLTA. ”

Sendo assim, o que procuramos ao adentrar na rede e no enorme oceano de novas “relações” são pessoas que pensem exatamente como nós pensamos, que estejam em pleno acordo com todos os nossos posicionamentos e opiniões. Dificilmente há a possibilidade de se investir em algum tipo de relação que traga junto o dispendioso trabalho de imprimir um diálogo honesto e verdadeiro entre as partes envolvidas, um verdadeiro intercâmbio cultural. Todavia, em que medida podemos compreender como comunicação relacionamentos que se constroem desse modo?

É por esse motivo que Mauro retoma uma expressão de Manuel Catells – “autismo eletrônico” – para nomear essas pseudo-relações formadas, principalmente, na rede. O termo forte se deve ao fato de que em relações que se formam tão somente por sujeitos milimetricamente iguais, não existe interatividade, conexão, interlocução, uma vez que as “relações” se tornam apenas a repetição dos mesmos sons, palavras e gestos emitidos.

O perigo da propagação dessa estrutura relacional está no enfraquecimento ainda maior da função primordial da comunicação, que é unir pessoas, não somente iguais – mas, acima de tudo, diferentes – para que assim haja um verdadeiro processo de difusão/compartilhamento cultural. Ao não se construir questionamentos acerca dessa problemática, há o risco de haver o aumento da intolerância em todas as vertentes: religiosas, políticas, sexuais, de gênero, étnicas, etc.; problema que, aliás, é visível em todos os lugares do globo, desde a crise dos refugiados na Europa, até o caos político no Brasil.

Walt Lippman diz que “Quando todos pensam igual é porque ninguém está pensando”. Certamente é isso que vem ocorrendo na medida em que estabelecemos relações que se baseiam na homogeneização do pensamento em detrimento da troca de ideias e, consequentemente, de culturas.

É preciso repensar as bases em que temos procurado estruturar as nossas relações, já que em plena era da comunicação, de um mundo que se diz globalizado, tornasse completamente paradoxal pensarmos que a nossa forma de ver o mundo é a única possível, pois é isso que fazemos ao desconsiderar o ser que pensa diferente como merecedor do nosso olhar, afeto e aprendizagem. É o olhar moderno e tecnológico de quem ainda enxerga o outro (diferente) como um novo mundo a ser explorado e conquistado, mesmo que seja como uma réplica de ideias e curtidas no Facebook.