É bastante comum o pensamento de que os opostos se atraem, sendo esta a ideia de que nos sentimos encantados pelas diferenças e que buscamos uma metade que nos complete. Verdadeiramente, na prática, nós nos seduzimos justamente por aquela pessoa que transparece um comportamento diferente do nosso.

Mas também, na prática, conviver com o diferente não dá certo e traz inúmeros transtornos em longo prazo. Principalmente se tratando de relações amorosas, fique com alguém parecido com você.

Essa história de imaturidade emocional e o medo da solidão não são propriamente questões modernas; há muito se discute as consequências disso na vida das pessoas e principalmente em suas relações. A incapacidade cada vez pior de lidar com a própria solidão é um dos motivos do grande número de relações amorosas de má qualidade que se vê nos dias de hoje.

O ser humano vive constantemente com uma sensação de incompletude, não importando o que se jogue lá dentro, esse vazio existencial não some. E, como consequência, as relações amorosas se tornaram também de péssima qualidade, justamente por se terem tornado uma busca desesperada para as pessoas se sentirem bem consigo mesmas e completas.

E é claro que, socialmente, as coisas são romantizadas e diluídas nos comportamentos, se fixando no ideal social de maneira que pareça natural, quando na verdade escondem o verdadeiro problema. É daí que surgem ideias românticas como “alma gêmea”, “os opostos se atraem”… Quem nunca se viu à procura da sua metade da laranja?

Toda essa mitologia no romantismo contribui para que acreditemos que o certo, ou no mínimo o comum, é você se apaixonar e se encantar por alguém muito diferente, e que vocês dois vão se completar até que a morte os separe.

Essa é uma pegadinha de mau gosto na qual todo mundo caiu e a maioria ainda cai, mas um pouco da culpa é também do fator psicológico, pois realmente, querendo nós ou não, temos uma disposição a nos sentirmos atraídos pelo diferente.

Atraídos justamente por essa necessidade de buscar completar-se no outro, a pessoa tímida tem a tendência de se apaixonar por uma pessoa extrovertida e sem inibição, pois, ao ter o outro, ela tem a extroversão que lhe faltava e se sente mais completa. Isso parece muito bom, na teoria.

Com o tempo, o que despertava admiração e era uma qualidade no outro se tornará uma fonte de irritação e desentendimentos, porque na prática os opostos podem até se atrair, mas na rotina da vida em comum as contradições se agravam.

Uma das principais causas do magnetismo entre os opostos é a falta de autoestima, pois quando não estamos satisfeitos com nosso modo de ser, procuramos alguém que seja o completo inverso e que nos preencha.

Quando a pessoa vive relativamente bem sozinha significa que já lidou um pouco com a sensação de vazio. Quem vive bem sozinho ganha a competência para estabelecer uma relação afetiva de melhor qualidade, pois, ao estar bem consigo mesma, a pessoa não coloca no outro a responsabilidade de a fazer feliz e preencher um vazio que nem mesmo o indivíduo sabe qual é. Quando aprendemos a lidar com nossos próprios males, cobramos menos do outro.

O amor une as pessoas, mas o que garante a continuidade das relações são suas afinidades. Uma relação amorosa de qualidade não depende tão somente da parte afetiva, mas também de todas as afinidades do casal no convívio do dia a dia.

Gostos musicais, comidas, meio social e até horários de dormir e acordar… Quanto mais parecidos forem os hábitos, gostos e afinidades, mais a chance desse casal ter uma relação duradoura e de qualidade.

Claro que não é possível ser completamente igual ao outro, mas quando não dá para combinar em tudo, o fundamental é combinar no caráter, no respeito e no bom convívio.

Porém, será que tendo respeito não é possível construir uma relação mesmo que entre pessoas diferentes? Fazendo concessões, cedendo aqui e ali? Bom, não cabe aqui falar do possível e impossível e, sim, de que a questão é que, em longo prazo (e cada vez a um longo prazo mais curto), as diferenças tendem a se acentuar.

O ideal para uma relação não é viver fazendo concessões, pois o indivíduo que ceder tem que agir de forma diferente do que ele pensa. A concessão deve ser mínima para não aprisionar um ou o outro dentro de uma dinâmica que o impeça de ser quem ele é. Quanto você abre mão de você mesmo para que sua relação exista?

Aí está a vantagem de ter um parceiro parecido, pois, não havendo desentendimentos, o número de vezes que será necessário fazer concessões será pequeno e ambos terão conforto na relação.

Os opostos podem até se atrair, mas não combinam e, ironicamente, as relações de qualidade só são possíveis com quem aprendeu a viver bem só. Pois, se pararmos para pensar, o romantismo propriamente dito e tudo o que circunda os ideais amorosos pouco nos ajudam a construir uma relação de qualidade. A realidade das relações mostra uma necessidade diferente do que é dito em poemas e canções.

A imagem do amor pintada pelo ideal romântico é de um amor imaturo e que se torna cada vez mais difícil e insustentável. Quem busca realmente um amor de qualidade com o outro deve aprender, primeiro, sobre si mesmo.

E claro, não se esqueça, fique com alguém parecido com você.

Uma sugestão de pesquisa e leitura para quem gosta do tema é o psiquiatra Flávio Gikovate e seu livo O Mal, o Bem e Mais Além, ele já faleceu mas deixou uma rica obra no estudo sobre as relações entre homens e mulheres.

Veja o vídeo também!