Entre os meses de dezembro e janeiro (não sei exatamente definir o momento), resolvi embarcar no desafio chamado “dez dias, dez filmes” no Facebook. A brincadeira começava a partir do convite de um amigo que pedia para que se repassasse a “corrente” para a frente. O objetivo era, a cada dia, postar uma foto de um filme sem dizer seu nome tampouco mencionar o enredo (a imagem deveria conter uma cena marcante de preferência). Fiz isso durante pouco mais de uma semana seguidamente e desrespeitando o princípio básico da ideia o fiz sem necessariamente um convite. Para quem já leu alguns dos meus textos, sabe que é comum encontrar recomendações cinematográficas ao final das postagens. Também recomendo livros, músicas, séries ou minisséries quando for o caso, mas os filmes constituem o meu grande hobbie. Costumo assistir a várias películas aos fins de semana. Desejaria ver um por dia disciplinadamente, mas confesso que isso depende bastante do estado de espírito.
Essa paixão compulsiva pelos filmes nasceu ainda na adolescência, alugando DVDs com os clássicos de Chaplin como “O Circo” e “Em Busca do Ouro”, obras-primas do cinema mudo. Depois de muita incursão nesse terreno do “preto-e-branco” dei um salto para a segunda metade do século XX e acabei evoluindo para François Truffaut e seu “A Mulher ao Lado” – um marco na minha precoce trajetória “cinéfila” – que me levou a explorar o icônico cinema francês. Dai foi pegar a lista dos “melhores filmes de todos os tempos” e “melhores filmes de drama” (meu gênero favorito) e ir vendo um por um – principalmente pela internet já que as locadoras dos anos 2000 entraram em declínio -, sem pretensões de grandes análises até pelo meu desconhecimento de um vocabulário mais técnico do campo fílmico. Encarei essas tarefas de ir assistindo o máximo de clássicos possíveis como um desafio de enriquecimento cultural ou mesmo de entretenimento e alivio para as dores desse mundo.
Enriquecimento que passa por ter tido as imagens de “Crepúsculo dos Deuses”, “Casablanca”, “Um Sonho de Liberdade” e “O Poderoso Chefão”, pedras fundamentais de Hollywood, gravadas no subconsciente; por ter sido levado a quebrar cabeça com a trilogia das cores e os filmes de Kiéslowski; por se embasbacar com a beleza dos diálogos das peças mais recentes do cinema iraniano contemporâneo; pela sensação de nostalgia de tempos que não se viveu gerada com o que de melhor Fassbinder e os alemães produziram ainda nos tempos do muro de Berlim; por ter tido orgulho com o grande salto que o cinema brasileiro deu na presente década; por acompanhar certa filmografia oculta mas de grande valor e por apreciar os encaixes narrativos formados com a azeda ironia e sagacidade dos espanhóis (Almodóvar que os diga) e a elegância latino-americana dos argentinos (viva o ator Ricardo Darin, nosso símbolo).
Nos 10 longa metragens que escolhi para os dez dias estão filmes que me marcaram significativamente, de diferentes épocas e cenários. O cerne do presente texto é justamente trazer a sinopse de cada um deles em um grande bloco de dicas. Ao contrário do que foi feito na rede social, aqui rompo com a brincadeira revelando nomes e histórias dos filmes que mexeram com a minha cabeça. Essa seleção também foi feita com muito pesar já que escolher dez títulos é necessariamente cometer uma injustiça flagrante com os mais de 800 ou 900 que parei pra apreciar nos últimos anos. Por isso fiz uma ponderação que acabou favorecendo o cinema europeu – sim, reconheço certa perspectiva eurocentrada nesse momento. Muitos diretores do meu coração se ausentaram (e tenho acompanhado o trabalho de vários monstros sagrados de ontem e de hoje como Godard, Trier, Scorsese, Allen, Hitchcock e/ou Gus Van Sant, principalmente dos seus longas agraciados no Oscar ou em Cannes), mas quem sabe um dia não faço uma listinha dos 100 melhores filmes – nominalmente, sem maiores explicações – e não compenso o lapso aqui apresentado?
Seguem os dez filmes:
01 – Cinema Paradiso (1988)
Nos anos que antecederam a chegada da televisão (logo depois do final da Segunda Guerra Mundial), em uma pequena cidade da Sicília o garoto Toto (Salvatore Cascio) ficou hipnotizado pelo cinema local e procurou travar amizade com Alfredo (Philippe Noiret), o projecionista que se irritava com certa facilidade, mas paralelamente tinha um enorme coração. Todos estes acontecimentos chegam em forma de lembrança, quando agora Toto (Jacques Perrin) cresceu e se tornou um cineasta de sucesso, que recorda-se da sua infância quando recebe a notícia de que Alfredo tinha falecido.
02 – O Sacrifício (1986), de Andrei Tarkovsky.
03 – E o Vento Levou (1939), de Victor Fleming.
Retratado no sul estadunidense do século XIX, esse longa histórico narra a história de Scarlett O’Hara, filha de temperamento forte do proprietário de uma plantação, e sua perseguição romântica por Ashley Wilkes, que é casado com a prima dele, Melania Hamilton, e seu casamento subsequente com Rhett Butler. Definida contra a era da Guerra de Secessão e da reconstrução dos Estados Unidos, a história é contada a partir da perspectiva dos sulistas brancos. Os papéis principais são vividos por Vivien Leigh, Clark Gable, Leslie Howard e Olivia de Havilland, que respectivamente interpretam Scarlett, Rhett, Ashley e Melanie.
04 – 8 ½ (1963), de Federico Fellini.
Prestes a rodar sua próxima obra, o cineasta Guido Anselmi (Marcello Mastroianni) ainda não tem idéia de como será o filme. Mergulhado em uma crise existencial e pressionado pelo produtor, pela mulher, pela amante e pelos amigos, ele se interna em uma estação de águas e passa a misturar o passado com o presente, ficção com realidade.
05 – Nos que nos Amávamos Tanto (1974), de Ettore Scola.
Uma das obras-primas de Ettore Scola, o filme descreve um período na história da Itália (1945 a 1975) e na vida de três grandes amigos: Gianni, Antonio e Nicola. Da resistência à ocupação nazista ao engajamento político dos anos 1960, acompanhamos as aventuras, desventuras e desilusões amorosas de uma geração que sonhava em mudar o mundo.
06 – Teorema (1968), de Pier Paolo Pasolini.
Em Milão a vida de uma rica família burguesa é totalmente modificada por um misterioso visitante (Terence Stamp), que seduz a empregada, o filho, a mãe, a filha e finalmente o pai. Além disto, tem um contato intelectual com todos eles, convencendo-os da futilidade da existência, e após cumprir seu objetivo parte em poucos dias. Após sua ida ninguém da família consegue continuar vivendo da mesma forma.
07 – A Hora do Lobo (1968), de Ingmar Bergman*.
Pintor (Max von Sydon) e sua esposa (Liv Ullmann) vão morar em uma ilha bastante afastada da sociedade. Lá, em meio a intensos conflitos psicológicos, o casal conhece um misterioso grupo de pessoas que passa a trazer angústias ainda maiores às suas vidas, levando-os a relembrar fatos passados e questionar a própria lucidez.
08 – Amor Sublime Amor (1961), de Jerome Robbins e Robert Wise.
No lado oeste de Nova York, à sombra dos arranha-céus, ficam os guetos de imigrantes e classes menos favorecidas. Duas gangues, os Sharks, de porto-riquenhos, e os Jets, de brancos de origem anglo-saxônica, disputam a área, seguindo um código próprio de guerra e honra. Tony (Richard Beymer), antigo líder dos Jets, se apaixona por Maria (Natalie Wood), irmã do líder dos Sharks, e tem seu amor correspondido. A paixão dos dois fere princípios em ambos os lados, acirrando ainda mais a disputa.
09 – A Aventura (1960), de Michelangelo Antonioni.
Um grupo de ricos italianos sai numa viagem de iate para uma ilha vulcânica deserta no Mediterrâneo, onde um dos passageiros, Anna, se perde dos demais. O namorado dela, Sandro, e uma amiga, Claudia, saem, sem sucesso, à procura de Anna e, durante a busca, acabam se apaixonando.
10 – A Lista de Schindler (1993), de Steven Spielberg.
A história real ronda em torno do alemão Oskar Schindler, que viu na mão-de-obra judia uma solução barata e viável para lucrar com negócios durante a guerra. Com sua forte influência dentro do partido nazista, foi fácil conseguir as autorizações e abrir uma fábrica. O que poderia parecer uma atitude de um homem não muito bondoso transformou-se em um dos maiores casos de amor à vida da História, quando este alemão abdicou de toda sua fortuna para salvar a vida de mais de mil judeus, em plena luta contra o extermínio alemão.
*O sueco, único a receber a Palma das Palmas em 1997, é meu diretor favorito. Recomendo a sua cinebiografia documental “Bergman – 100 anos” que estreou em 2018.
Encerro esse texto com uma música da banda paulista Francisco El Hombre em parceria com Liniker e os Caramelows 🙂