Mario Sergio Cortella fez uma participação no programa Sempre um Papo para o lançamento do seu livro com Frei Betto e Leonardo Boff: “Felicidade – Foi-se Embora?”. Confira abaixo a transcrição de um trecho do programa onde Cortella fala sobre felicidade.
“Nós, às vezes, ouvimos as pessoas dizerem “Um dia eu vou ser feliz”. Essa é uma frase estranha, porque ela supõe que a felicidade seja um lugar aonde você chega, e, ao chegar nele, você para, repousa e descansa. Porém, a felicidade não é o lugar aonde se chega: a felicidade é uma ocorrência, é uma circunstância eventual. Você e eu somos capazes de ter vários momentos de felicidade e não somos capazes de ter a felicidade contínua, aliás, a percepção da felicidade contínua anularia a própria sensação de felicidade. Nós valorizamos o que temos, também, pela carência. Nós só percebemos a importância da natureza quando ela se rarefaz à nossa volta. Nós só percebemos a importância da partilha quando ela se ausenta da nossa volta.
Na vida, a felicidade não pode ser um estado constante porque, nesse caso, ela nem seria percebida. Por exemplo, se uma pessoa sente prazer ao tomar vinho, ela só o sente porque não bebe essa bebida o tempo todo, ao contrário do alcoólatra, que não sente prazer ao beber bebidas alcoólicas: ele tem dependência delas, e dependência é diferente de prazer. Prazer é quando você deseja fazer algo e o faz, mas não o tempo todo. Não podemos ser felizes constantemente e nem deveríamos, até porque nós só sentimos gozo naquilo que é o momento feliz justamente porque ele não é contínuo, seja no abraço, na partilha do alimento, numa reflexão etc.
Como lembrou Boff, felicidade é a partilha. Não dá para imaginar uma boa fala nossa supondo que mais de mil e tantas pessoas não podem participar. Então a gente tem que organizar o local e a vida de maneira que todos nós possamos caber. Num determinado momento, nos dá vontade de só nós cabermos, mas isso nos infelicita, porque você até frui, mas é impossível ser feliz sozinho.
Quem diz “Eu, um dia, vou ser feliz” dificilmente o conseguirá, porque pressupõe que a felicidade esteja no horizonte. E ela está no cotidiano, mas não o tempo todo. Felicidade não é euforia. Felicidade não é mero prazer. Felicidade não é a sua alegria. Alegria, euforia e prazer fazem parte da felicidade, mas não a esgotam, não a tornam completa. Uma pessoa que for continuamente eufórica não é feliz: ela está com alguma demência. É absolutamente demente, neste mundo de turbulência, dificuldade e encrenca, que alguém seja o tempo todo feliz. Alguém nessa condição é o que nós chamamos de bobo alegre. Por isso, felicidade é algo muito mais denso do que isso. Muito mais do que euforia. No meu entender, a felicidade é quando você sente a vida vibrar em você. Quando você sente fertilidade, você sente que sua vida é uma dádiva estupenda, misteriosa e cheia de vigor.”
Transcrição feita e adaptada pelo Provocações Filosóficas do vídeo: Frei Betto, Leonardo Boff e Mario Sergio Cortella – Parte 1 – 30 anos do #SempreUmPapo
Confira na íntegra:
Quem diz “Eu, um dia, vou ser feliz” dificilmente o conseguirá, porque pressupõe que a felicidade esteja no horizonte. E ela está no cotidiano, mas não o tempo todo. Felicidade não é euforia. Felicidade não é mero prazer. Felicidade não é a sua alegria. Alegria, euforia e prazer fazem parte da felicidade, mas não a esgotam, não a tornam completa.
Mario Sergio Cortella, nascido em Londrina/PR em 05/03/1954, filósofo e escritor, com Mestrado e Doutorado em Educação, professor-titular da PUC-SP, na qual atuou por 35 anos.
É autor de diversos livros nas áreas de educação, filosofia, teologia e motivação e carreira.