
O povo brasileiro é, sem dúvida, conhecido por sua alegria contagiante e calor humano. Mas, por trás dessa imagem calorosa, existe uma realidade desconfortável: a passividade diante dos problemas e a constante busca por um “salvador”. O brasileiro, em sua maioria, espera que alguém — um líder, um político ou uma figura externa — tome a frente e resolva os problemas estruturais do país. Mas o que muitos ainda não percebem é que essa busca por soluções fora de si mesmo não é uma falha apenas no comportamento do povo, mas sim uma consequência direta do próprio sistema que se alimenta dessa passividade. A verdade é que o sistema não está apenas corrompido; ele é a corrupção em si. Mudanças dentro do sistema são sempre teatrais, superficialmente permitidas, mas, no fundo, são parte do jogo de controle. E é por isso que, enquanto a população continuar esperando por soluções externas, o Brasil permanecerá estagnado.
O sistema no Brasil, e em muitas outras partes do mundo, não é apenas um mecanismo que precisa de ajustes; ele é, em sua essência, projetado para manter a passividade, controlar a narrativa e garantir que a verdadeira transformação nunca aconteça. Mudanças dentro desse sistema são feitas de forma escusa, com objetivos próprios, e nunca para o real benefício da população. Elas acontecem como um teatro — uma performance cuidadosamente montada para dar a impressão de que algo está sendo feito, mas sem alterar a estrutura que perpetua a desigualdade e a corrupção.
Em “O Príncipe”, Maquiavel já antecipava o funcionamento desse jogo de manipulação. Ele acreditava que os governantes poderiam — e deveriam — usar as emoções e o pensamento superficial das massas para garantir seu poder. As promessas de mudança são feitas constantemente, mas sem uma mudança real no funcionamento do sistema. Esse é o mesmo jogo que observamos hoje. Políticos, líderes e sistemas de poder mantêm a população entretida com soluções rápidas, mas essas soluções nunca chegam a tocar as raízes dos problemas. As mudanças que ocorrem são sempre superficiais, permitindo que o sistema continue intacto. A população, seduzida por promessas emocionais e imediatas, nunca questiona o verdadeiro funcionamento das estruturas que a oprimem.
Freud, em A Psicologia das Massas, oferece uma explicação psicológica para esse comportamento. As massas, quando se encontram em situações de incerteza e sofrimento, se tornam vulneráveis a líderes que oferecem uma sensação de segurança, mesmo que essa segurança seja ilusória. No Brasil, a figura de um “salvador da pátria” surge como uma resposta emocional ao caos social. O povo, cansado e desiludido com o sistema, se apega à ideia de que alguém de fora — seja um político, uma figura carismática ou um movimento — vai solucionar os problemas, sem perceber que esse “salvador” está, na verdade, dentro do próprio sistema corrupto. O desejo de mudança e melhoria está tão forte que as pessoas acabam aceitando promessas vazias, sem nunca questionar a fundo a verdadeira natureza dessas soluções.
Platão e Aristóteles, em suas reflexões sobre o governo e o comportamento humano, também ressaltam a importância da razão sobre a emoção nas decisões sociais e políticas. Platão, em “A República”, advertia sobre o risco de governar pelas paixões das massas. Quando a sociedade é movida por emoções e não por uma reflexão racional e coletiva, ela se torna facilmente manipulada, dando espaço para a perpetuação do controle e da manipulação. Aristóteles, por sua vez, apontava que a verdadeira justiça e prosperidade social só seriam alcançadas quando as decisões fossem tomadas com base no equilíbrio entre razão e emoção. No entanto, o que vemos no Brasil é que as emoções da população, particularmente o medo e a esperança, têm sido exploradas por aqueles que controlam o sistema. Em vez de se mover para um lugar de reflexão profunda e mudança real, a sociedade segue sendo manipulada por discursos vazios.
A questão mais profunda, porém, está no fato de que não haverá mudança dentro do sistema. O sistema é a corrupção. Não existe espaço para aqueles que realmente buscam o bem das pessoas, pois qualquer tentativa de transformação genuína é silenciada ou absorvida pelo próprio mecanismo de poder. As chamadas “mudanças” que acontecem são feitas de maneira escusa, como moeda de troca, sempre em benefício de quem já detém o poder. O sistema, com sua fachada de democracia, justiça e igualdade, é, na realidade, um teatro de manipulação onde o povo é espectador de um espetáculo encenado para dar a ilusão de que as coisas estão mudando. Mas a mudança verdadeira nunca acontece, pois o próprio sistema é projetado para manter o status quo.
Neste cenário, a salvação do Brasil não virá de fora, não virá de políticos ou de líderes carismáticos. Ela é individual e somente individual. Não há mais espaço para esperar por soluções externas, pois todos os caminhos estão contaminados. As promessas de mudança são apenas distrações que mantêm o povo distante da verdadeira transformação. Para que algo realmente mude, é necessário que a população entenda que a salvação não está no político, no partido ou em uma figura messiânica. A salvação está na ação individual, na reflexão crítica e na recusa em ser manipulada. Só quando cada um de nós assumir a responsabilidade por nossa própria transformação, e, coletivamente, por nossa sociedade, poderemos realmente começar a mudar algo.
O sistema está podre. Ele não vai se reformar por si mesmo. Não há nenhuma “reforma” que possa ser feita dentro de uma estrutura que é, por natureza, opressiva e corrupta. A verdadeira mudança começa na conscientização de que, para que algo real aconteça, precisamos abandonar a ideia de um salvador externo e abraçar a verdade de que somos nós mesmos os responsáveis pela nossa transformação. O teatro das tesouras, onde todos jogam para manter o controle, só pode ser desfeito quando nós, como sociedade, decidirmos parar de esperar e começar a agir.