Qual o preço que um homem paga para ser livre? E para ser feliz? Alex Supertramp pagou seu preço. Caro, duro, mas, pagou. Quantos de nós estamos dispostos a pagar o preço da liberdade e da felicidade? Ah! Não me venha com essa de radicalismo e idealismo. Ou será que ser livre e feliz é um ideal inatingível?
Se for idealismo, o mercado é mentiroso, pois vende o tempo inteiro a sua fórmula da felicidade. Do mesmo modo, a sociedade moderna também é falsa, pois foi construída sob a égide da liberdade. Obviamente, em ambas questões a resposta tende a confirmar o caráter fantasioso da liberdade, já que a sociedade moderna capitalista é uma “grande” contadora de estórias. Entretanto, Alex não entendia como idealismo, por isso saiu da ilha maluca que habitamos para que pudesse ver a ilha e, então, encontrar a sua própria ilha. Saiu dos axiomas falsos e buscou um refúgio onde poderia se encontrar.
A resposta veio: “A felicidade só é real quando compartilhada”. Muitos podem dizer, mas, isso é óbvio. Teria que afastar-se da sociedade e morrer para descobrir isso? Sim. Teria que se afastar. Ele estava tão contaminado, tão intoxicado com o egoísmo e o individualismo da vida social, que teve que fazer a sua peregrinação. O que não conseguimos perceber é a cegueira que nos encontramos, pois a resposta que Alex encontrou era óbvia, mas estamos tão cegos que sequer nos damos conta. Presos no mundo das superficialidades, servos do sistema que somos, acreditamos que a real felicidade vem tão somente do material.
Os seus pais achavam que comprando um carro novo o faria feliz. Mas, Alex não queria um carro novo. Queria, talvez, que perguntassem o que sente e pedissem desculpas pelo sofrimento que sofrera. Mas, não. O que podiam fazer, o que só sabiam fazer, era comprar, achando que através do consumo qualquer indivíduo se torna feliz. Seus pais eram apenas mais alguns entre tantos do mundo novo. Pessoas que não escutam, que não olham, que não abraçam, que não se beijam, apenas compram. Afinal, existe outra forma de ser feliz?
Sendo assim, estamos com a cegueira branca de Saramago ou com a cegueira moral de Bauman. Tanto faz. Não conseguimos enxergar que as pessoas são mais do que objetos e que os sentimentos não podem ser comprados (ainda que tentem vendê-los em pílulas). Ou seja, não conseguimos enxergar que a felicidade depende de pessoas e não de coisas. Da forma como nos olhamos, nos respeitamos e nos amamos. Mas, preferimos comprar mentiras para que possamos nos sentir “felizes”.
“O CONSUMO É UMA MÁSCARA QUE COMPRAMOS, ACHANDO TER ENTÃO COMPRADO A FELICIDADE.”
Entretanto, como diz o ditado – “mentira tem perna curta”. Assim, logo necessitamos de novas mentiras, digo, consumir novas máscaras, a fim de que nos mantenhamos com a aparência da felicidade. E, diante de tanta teatralidade, o óbvio passa despercebido. Não percebemos como um sorriso ou um elogio podem mudar o dia de alguém. Não percebemos que palavras machucam e que perdoar é um ato que nos aproxima do divino. Não percebemos que amigos não se compram no Shopping Center.
Estamos doentes, tristes, solitários, cheios de depressões e ansiedades, nunca estamos satisfeitos e, portanto, somos infelizes. Mas, preferimos continuar com a devoção ao deus consumo, como se num ato de misericórdia, ele fosse nos salvar. Todavia, ele não vai nos salvar, porque ele não é a salvação. A salvação depende de cada um e do que cada um faz para sugar a essência da vida, pois se a felicidade só é real quando compartilhada, devemos superar essas mesquinharias e fazer mudanças profundas no nosso ser.
A morte de Alex não se deu por extremismo, e sim pelo estágio caótico que a sociedade se encontra. Estamos apodrecendo e morrendo sem viver. E tudo isso por preguiça e covardia de romper com as esmolas do capital. A caminhada não é fácil, mas é necessária. Em um ônibus mágico foi encontrado o que é a felicidade. Longe de mim, de você e de todos. Longe de carros, fama e sucesso. Chegar até lá pode demorar, mas todos nós somos capazes de chegar, embora para isso, seja necessário deixar algumas bagagens. Enquanto não aprendermos a deixar essas bagagens, continuaremos sem ter, como disse Oscar Wilde, a capacidade rara de viver e, como a maioria dos homens, permaneceremos apenas existindo.