Quem nunca sonhou em ser arrebatado de uma situação embaraçosa ou sufocante, um emprego que violenta os ideais legítimos da alma, uma relação que transformou a alegria e o desejo em lembranças distantes?
Quem de nós poderá dizer que jamais teve o ímpeto de sair correndo, qual um “Forrest Gump” que subverteu o destino que lhe cabia como um garoto qualquer, definido como alguém que possui inteligência fora da média e se transformou num homem sensível, ingênuo e com uma incrível propensão para estar nos lugares certos na hora certa. Quem de nós, nunca alimentou o desejo secreto de tal um “Forrest”, tornar-se ídolo de uma nação inteira por salvar um pelotão completo de homens em meio à guerra sangrenta e injusta?
Assim como “Forrest”, temos nossas idas e vindas em momentos cruciais, de nossa própria história e, também, de histórias alheias, as quais tocamos com maior ou menor intensidade, intencionalidade, delicadeza ou violência. Somos todos meio perdidos à espera de alguém que nos organize, nos acalente, nos tranquilize em colos de amor incondicional ou nos faça despertar para uma força já nossa, mas que sequer suspeitávamos existir.
Existimos e somos constituídos pelas inevitáveis invasões de território dos nossos semelhantes e dos nossos absolutamente diferentes. Somos ovo, lagarta, pupa e borboleta. Mas, não exatamente nessa ordem perfeita que vive contida na metamorfose de seres cuja vida é tão mais breve (e leve), do que a nossa.
Perseguimos coisas cuja utilidade não é nada clara pra nós; abandonamos a infância cedo demais; passamos pela adolescência qual raios carregados de uma energia violenta, ruidosa e explosiva; chegamos à fase adulta como viajantes perplexos que embarcaram numa nave desconhecida, escolheram um destino e foram aportados num lugar qualquer… Diferente, estranho, assustador! Não era aí, afinal, que esperávamos chegar. Tínhamos sonhos, éramos audaciosos e atrevidos. Não sabemos o que fazer com essas superfícies polidas, essas linhas retas, essa vida previsível. Olhamos ao redor e o que vemos nos assusta. Somos tão iguais. Somos tão diferentes.
Estamos à nossa própria sorte, percorrendo labirintos de vontades que deixamos para trás; sentados sobre pilhas de certezas que não nos respondem nada; cercados de muros que nos protegem do que está lá fora, mas não nos ajuda em nada a tentar descobrir o que nos vai por dentro.
Então… Quem sabe um dia desses, ao abrir nossos olhos pela manhã, sejamos surpreendidos por uma brincadeira amorosa do destino: teremos recuperado a habilidade de ver o que víamos quando ainda não havíamos feito a passagem para o lado de cá. Somos crianças outra vez! Nosso medo é volátil, passa no calor de um colo amoroso. Não temos certeza de nada. Somos cheios de perguntas. Estamos vivos!
E, com essa segunda chance palpitando em nosso peito feito um bichinho selvagem que não conhece nem as grades, nem as gaiolas… Teremos a coragem de viver uma vida diferente. Uma vida cuja grandeza afetiva, fará cada segundo valer à pena; cuja libertação da alma, transformará cada passo no começo de um caminho novo, que inclui o outro e exclui a arrogância. Assim, descobriremos que em nosso coração, tenso e fechado em concha, havíamos guardado um bilhetinho amassado e gasto; um bilhetinho que escrevemos com a caligrafia incerta e redonda de criança. Nele, a libertação: ARRUMA A MALA, FUGIMOS HOJE Á NOITE! A criança que fomos veio resgatar o adulto que já estamos cansados de ser. Que sejamos fortes, atrevidos e libertos para aproveitar a viagem!
Postado originalmente em ContiOutra