“Falarei de pequenos gestos, atos e princípios que mantêm uma relação viva, mas não tratem isso como uma receita e, sim, como uma maneira de existir de algumas pessoas.
Imaginem uma cena ridícula, de fundo de quintal, onde determinada mulher está esperando o seu marido chegar em casa porque ela quer pôr um pinguim de louça em cima da geladeira – ela quer decidir, junto a ele, de qual lado colocar o pinguim. Com isso, o marido se sente necessário e suficiente por participar do desejo da esposa, o que se classifica como “tesão”.
Outro exemplo de tesão seria uma senhora de setenta e oito anos que compra uma cinta liga com o intuito de fazer o seu marido olhá-la, sendo algo que ela nunca havia feito antes, ou seja, ela se direciona em favor do desejo dele por ele. Ela faz uma oferta, colocando-o como participante de tal, e isso é o tesão, que é a manifestação psíquica do desejo pelo outro.
Determinado camelô passa pela Rua 13 de Maio, na cidade de Campinas, e vê um chaveiro de bruxa, lembrando-se imediatamente de sua esposa e levando-o para ela. Esse objeto simbólico é uma maneira do marido ter a esposa como um objeto fundamental de desejo em sua vida.
Sobre a manutenção de uma união, seja em qualquer casamento (entre um homem e uma mulher, entre dois homens, duas mulheres, entre pai e filho, entre amigos etc.), a certeza de sobrevivência de qualquer relação é a capacidade de fazer com que o outro continue a se sentir como objeto de desejo, desejo esse que pode ser s*xual ou não.
Às vezes, escutamos histórias como, por exemplo, de um senhor que arranjou uma amante, sendo que ele tem uma linda esposa. Mas ele não consegue mais transformar o belo corpo de sua esposa em zonas erógenas, ou seja, não consegue mais a erot*zar. Sua amante, por outro lado, é considerada feia, além de ser gorda, pobre e suja, mas ela o levou até a sua casa porque descobriu que ele gosta de polenta e então lhe fez o alimento.
Nós rimos da pequenez que isso tem, porém, na medida em que esse sujeito sente que um desejo seu passa a fazer parte da vida da outra ele se sente desejado e, quando alguém se sente desejado, não importa qual é o objeto desejante. O narcisismo acaba, então, o objeto não precisa ser mais belo e, sim, íntegro.
Eu aconselho aos pais que viajam muito e que, consequentemente, ficam muito tempo longe de seus filhos que, quando forem desembarcar, que tragam, do avião, os objetos que usaram lá, como a maleta de comida, o guardanapo, whisky etc., e levem-nos para os seus filhos. Esse é o presente mais lindo que um filho pode receber porque ele se sente desejado pelos pais: se sente desejado em um momento de prazer deles.”
Transcrição adaptada pelo Provocações Filosóficas do trecho da palestra: Casamento, Desejo e S*xo | Ivan Capelatto no CPFL Cultura.
Confira o trecho do vídeo:
Confira na íntegra:
Ivan Capelatto é psicólogo clínico e psicoterapeuta de crianças, adolescentes e famílias. fundador do grupo de estudos e pesquisas em autismo e outras psicoses infantis (gepapi), e supervisor do grupo de estudos e pesquisas em psicopatologias da família na infância e adolescência (geic) de cuiabá e londrina.
Mestre em psicologia clínica pela puc-campinas, é professor convidado do the milton h. erickson foundation inc. (phoenix, arizona, usa) e professor do curso de pós-graduação da faculdade de medicina da puc – pr. Autor da obra “diálogos sobre a afetividade – o nosso lugar de cuidar”.