
Nos últimos tempos, o assunto político tem dominado rodas de conversa, capas de jornais, timelines de redes sociais e, principalmente, os sentimentos das pessoas. A indignação tomou conta. Manifestações virtuais e físicas se multiplicam, com palavras de ordem contra a corrupção, exigência por ética e, claro, muitos pedidos de impeachment — mesmo que, às vezes, escritos de forma errada. Perfis nas redes sociais crescem rapidamente apenas por vociferarem contra os “políticos ladrões”, recebendo milhares de curtidas e seguidores sedentos por justiça.
É evidente que a corrupção nos incomoda, e com razão. Ela afeta diretamente os serviços públicos, a economia e, acima de tudo, o senso de justiça da população. Mas há algo que poucos estão dispostos a encarar: a corrupção não começa em Brasília, nem no Congresso, nem nos gabinetes luxuosos do poder. Ela começa no cotidiano — em atitudes pequenas, muitas vezes ignoradas, que se repetem todos os dias entre nós.
A pergunta que não quer calar é: por que é tão difícil encontrar um político com ficha limpa bem posicionado nas eleições? Talvez porque a política seja apenas um reflexo da sociedade que a sustenta. E nessa sociedade, infelizmente, temos a tendência de normalizar os pequenos desvios de conduta — especialmente quando nos favorecem.
Sabe aquele troco a mais que você recebeu por engano e não devolveu? Aquela carteira encontrada no chão, mas que você ficou por “não saber o dono”? Ou o produto comprado por um preço muito abaixo do normal, mesmo desconfiando que era fruto de roubo? E a dívida que você espera que “caduque” só para não ter que pagar? A desculpa esfarrapada para colar na prova ou a famosa “carteirada” para furar a fila? Tudo isso é corrupção. Disfarçada, socialmente aceita, mas ainda assim corrupção.
Muitos criticam os políticos por abusarem do poder para benefício próprio, mas quantos não fariam o mesmo se estivessem na mesma posição? A diferença entre o cidadão que tenta se dar bem em tudo e o político corrupto pode estar apenas na escala, não na intenção. Ambos agem com base no mesmo princípio: o de tirar vantagem em qualquer situação, independentemente das consequências.
É preciso, sim, denunciar e combater a corrupção em todas as esferas. Mas é hipocrisia exigir ética de quem está no poder sem revisar as próprias atitudes. De que adianta bradar contra o sistema se você também o contorna sempre que pode? De que adianta pintar o rosto, vestir a camisa da pátria e ir às ruas, se no cotidiano você dá mau exemplo aos seus filhos, colegas e à sociedade?
Não se trata de minimizar os crimes de colarinho branco ou isentar políticos corruptos de suas responsabilidades. Longe disso. Mas se quisermos uma mudança verdadeira e duradoura, ela precisa começar na base — e a base somos nós. Ética, caráter e responsabilidade não podem ser apenas bandeiras em protestos. Precisam ser práticas diárias, constantes, silenciosas e honestas, mesmo quando ninguém está olhando.
A transformação que tanto pedimos para o Brasil não virá de um salvador da pátria, de um novo partido ou de uma eleição milagrosa. Ela virá do exemplo. E esse exemplo deve começar dentro de casa, nas pequenas decisões do dia a dia. Só assim teremos, no futuro, políticos mais íntegros: porque terão vindo de uma sociedade que aprendeu, de fato, o que é integridade.