Quem nunca se perdeu em devaneios tentando imaginar como seria a vida se tivesse feito outras escolhas? Estaria mais feliz? É difícil responder, mas é inegável que não se pode voltar ao passado e, por isso é tão difícil fazer escolhas. Mas, ainda que imaginemos ter feito escolhas erradas, não há nenhuma escolha que não traga vicissitudes. Assim, não adianta ficar paralisado pelo medo e pela dúvida. É preciso arriscar e esperar as consequências.
Essa problemática aparece no filme “Sr. Ninguém”, protagonizado por Jared Leto. Grosso modo, a trama gira em torno de Nemo Ninguém, um ancião de 117 anos que não se lembra quem é (por isso o seu sobrenome: “Ninguém”). Na tentativa de descobrir quem é, ele cria diversas fantasias de vidas vividas de diferentes formas, nas quais ele sempre faz escolhas distintas. Entretanto, em nenhuma delas ele chega a sua idade, fato que comprova que os seus devaneios são apenas fantasias e não memórias.
Diante disso, o protagonista (e nós) percebe que a sua máxima de que – “Enquanto não escolhemos, tudo é possível” é falsa, uma vez que toda escolha anula outras possibilidades (inclusive, não escolher, que também é uma escolha) e que viver é um processo de perdas. Quando se faz uma escolha, sempre se deixa de fazer outra e, consequentemente, perde-se alguma coisa. Não há como permanecer com todas as possibilidades de forma contínua. Pelo contrário, quando não fazemos escolhas, passamos a seguir por caminhos estranhos e com o tempo nos tornamos estranhos de nós mesmos.
Deixar-se dominar pelo medo das consequências de uma escolha, apenas impede que façamos as escolhas que realmente queremos. Até mesmo porque, nunca haverá uma escolha que seja perfeita, que não traga problemas e dificuldades. Como é dito em certa parte do filme – “Na vida, você tem apenas uma tomada, se for ruim, apenas lidamos com isso”. Ou seja, não há como voltar e agir de outro modo. A fumaça nunca volta para o cigarro, portanto, as consequências, mesmo que de uma escolha errada, devem ser encaradas, pois foram frutos de uma escolha sua.
Errar é pertinente à caminhada. Mas, esses erros só servem como aprendizado quando deliberamos sobre a vida, isto é, quando nos permitimos escolher e errar. O erro, inclusive, é inevitável, pois como diz Milan Kundera somos atores entrando no palco sem nunca ter ensaiado, de modo que não temos outra coisa a fazer que não encenar/viver, mesmo sem saber como.
“Não existe meio de verificar qual é a boa decisão, pois não existe termo de comparação. Tudo é vivido pela primeira vez e sem preparação. Como se um ator entrasse em cena sem nunca ter ensaiado. Mas o que pode valer a vida, se o primeiro ensaio da vida já é a própria vida?”
Nemo não se permitia errar, por isso não fazia escolhas e, assim, não consegue se lembrar quem é, já que são as escolhas que nos formam. Assim como ele, nós muitas vezes ficamos paralisados diante do abismo que uma escolha pode trazer e, dessa forma, somos levados pelas escolhas que os outros querem, mas que são estranhas ao nosso coração.
Quantas vezes desistimos de algo por imaginarmos as dificuldades que iríamos enfrentar? O que não atentamos é que, como já disse, qualquer outra escolha também trará dificuldades e quando esta não é feita pelo nosso coração, certamente nos arrependeremos muito mais. Aliás, não há nem arrependimento, posto que arrepender-se pressupõe escolha e como a decisão não foi tomada de fato por nós, não existe a possibilidade lógica de arrependimento.
É preciso escolher. É preciso arriscar. É preciso errar. Só assim crescemos e podemos nos olhar no espelho e nos enxergar. Do contrário seremos como Nemo, um rascunho frágil de uma vida que não consegue se ver. Devemos ter a coragem de viver e não apenas existir, de ser quem somos e escolher o que faz o nosso coração se sentir melhor, mesmo que depois nos arrependamos, pois uma vida bem vivida é aquela que chegada a hora da morte, temos certeza que vivemos da melhor maneira de pudemos e que em cada suspiro deixamos a nossa marca. O pior na vida não é ter medo das consequências, do futuro, da morte. Mas, de como diz o próprio Nemo – “Não ter estado vivo o suficiente”.